Mais do que um making of de Pumping Iron, é um autêntico documentário sobre o docudrama que tirou a musculação profissional da idade da pedra e a impulsionou da obscuridade aos holofotes. Autêntico rito de passagem, Pumping Iron projectou o nome improvável de Arnold Schwarzenegger para o estrelato e expôs a cultura do físico a um público tão abrangente que mudou radicalmente a perspectiva mundial face à importância do exercício e preparou o terreno para os vídeos de ginástica de Jane Fonda (1982) e de diversas top models (Elle McPherson, Cindy Crawford e Cláudia Schiffer) ao longo dos anos 80.
O culturismo, até meados dos anos 70, não passava de uma subcultura marginalizada, associada a indivíduos com falta de auto-estima, que procuravam ultrapassar as suas inseguranças através da transformação dos seus corpos ao exagero caricatural. Tirando o ocasional sucesso de um George Atlas ou John Reeves, esta prática desportiva era algo anunciado nas páginas de banda desenhada dos jornais e revistas e as demonstrações não alcançavam um público superior a trezentas cabeças em pequenos auditórios.
Após ter feito a cobertura do Concurso Mr. Olympia de 1972 para a revista Life e o subsequentemente livro de fotografia Pumping Iron: A Arte e o Desporto do Culturismo se ter tornado popular e lucrativo, o passo seguinte para o fotógrafo George Butler seria transpor o conceito para a 7ª arte. Sem a menor experiência no meio cinematográfico, Butler propôs-se a filmar os treinos de diversos culturistas em competição para o Mr. Universo e Mr. Olympia de 1975, e a própria cerimónia, a realizar-se em Pretória, África do Sul.
A primeira dificuldade surgiu logo à partida. Butler estava convencido de que o filme não funcionaria sem a presença de Arnold Schwarzenegger, mas este, após ter ganho o título de Mr. Olympia cinco anos consecutivos, decidira desistir das competições. Foi preciso convencê-lo a tentar mais um ano. Ultrapassado esse obstáculo, o herói precisava de um oponente, alguém que fizesse de vilão. Para encontrá-lo, recorreu-se a Joe Weider, co-fundador da Federação Internacional de Culturismo, criador dos títulos Mr. Universo (amadores) e Mr. Olympia (profissionais), editor de inúmeras publicações dedicadas ao físico e ainda implementador de equipamento para ginásios e de suplementos nutritivos. Weider já estava farto do rosto de Schwarzenegger nas suas capas e tinha alguém em vista para substituí-lo: Lou Ferrigno, um nova-iorquino de Brooklyn, bi-campeão do Mr. Universo.
A necessidade de antagonismo era imprescindível, na óptica do realizador, mas rapidamente percebeu que Lou Ferrigno não ia cumprir o papel de ameaça. Apesar de ser o concorrente mais alto (1,94m), faltava-lhe a garra necessária à vitória. Tendo sofrido 80% de insuficiência auditiva aos 3 anos de idade e ter dificuldades em falar, era um indivíduo tímido e simpático, com um pai dominador, uma criatura odiosa que nunca antes se interessara pelos treinos do filho e agora se fazia passar por seu treinador pela fome de protagonismo. O ressentimento que nutriam um pelo outro ficou patente na película, revestindo-a de outra camada humana.
Devido à vulnerabilidade de Ferrigno, Schwarzenegger teve de assumir o papel de debulhadora, esmagando tudo no seu caminho. Não só seria o herói, como também o vilão. Enquanto que os outros participantes falam em dar o seu melhor, o discurso de Arnold é sobre tenacidade e hegemonia. Arrogante e presunçoso, evidencia um controlo e concentração ímpares, com uma personalidade motivada para o sucesso a todo o custo. Em Raw Iron, admite pela primeira vez que algumas das suas afirmações foram desproporcionadas ou invenção pura e simples, mas algumas ressoariam na memória dos fãs durante décadas. Por exemplo, sobre não ter comparecido ao funeral do pai por estar numa fase crítica dos treinos, ou afirmar com uma naturalidade impressionante ser capaz de desmotivar os rivais mais perigosos e fazê-los perder, quando o abordavam a pedir conselhos. Em Raw Iron, acrescenta ter tomado esteróides anabolizantes, mas que os mesmos se encontravam em fase experimental, à época, e não eram ilegais.
O filme conseguiu uma grande carga de realismo porque os culturistas confiavam plenamente no realizador, com quem há muito já privavam. Apesar do filme colocar os seus astros em diversas situações sociais provocadas, a maior parte destas cenas ficou na sala de montagem porque, ao fim de 100 horas de gravações, a pressão era tão grande para que o projecto fosse rentável que o realizador se concentrou numa óptica da luta de egos. Cortou cenas que evidenciavam fraternidade entre os diversos praticantes e criou tensão onde esta não havia, recorrendo inclusivamente à gravação de novas cenas para enfatizar situações já filmadas (o pormenor da t-shirt de Mike Katz roubada por Ken Waller).
Arnold Schwarzenegger acabou por ganhar o 6º título de Mr. Olympia e Lou Ferrigno ficou em 3º lugar, atrás do francês Serge Nubret. Na categoria abaixo dos 91 kg, ganhou Franco Columbu. Na coroação, Schwarzenegger despediu-se finalmente das competições, mas viria a fazer uma pausa na sua reforma para ganhar o Mr. Olympia de 1980. Franco Columbo venceria em 1976 e em 1981. Lou Ferrigno só voltou a competir no Mr. Olympia em 1992 e 1993 (ficou em 12º e 10º lugares, respectivamente) e no Masters Olympia de 1994 (2º lugar), aos 43 anos (como documentado no filme Stand Tall, 1997). Arnold Schwarzenegger seguiu a carreira cinematográfica que lhe conhecemos, com os seus primeiros passos nos icónicos papeis de Hércules, Conan e Terminator. Franco Columbu produziu e representou em filmes de baixo orçamento feitos na Sardenha natal (em Terminator, de 1984, Columbu representa o Terminator do futuro que destrói um esconderijo dos rebeldes, na cena em que a foto de Sarah Connor se perde nas chamas). Lou Ferrigno foi o Incrível Hulk na série televisiva (1978/1982) e em três telefilmes; no cinema, foi Hércules e Sindbad e teve um cameo em ambos os filmes do Hulk do novo milénio.
Filmado e montado Pumping Iron, surgiu um novo problema: George Butler estava falido, tendo esgotado os cartões de crédito. Numa desesperada medida de marketing, para atrair investidores e inferir do interesse público, promoveu uma exibição no Whitney Museum of American Art, em NYC, com críticos de arte presentes para avaliarem o corpo dos actores do filme em poses artísticas, em cima de plataformas circulares. Inesperadamente, antes da abertura das portas já se acotovelavam nas bilheteiras mais de 5000 pessoas. Pumping Iron estrearia no ano seguinte.
Após ter feito a cobertura do Concurso Mr. Olympia de 1972 para a revista Life e o subsequentemente livro de fotografia Pumping Iron: A Arte e o Desporto do Culturismo se ter tornado popular e lucrativo, o passo seguinte para o fotógrafo George Butler seria transpor o conceito para a 7ª arte. Sem a menor experiência no meio cinematográfico, Butler propôs-se a filmar os treinos de diversos culturistas em competição para o Mr. Universo e Mr. Olympia de 1975, e a própria cerimónia, a realizar-se em Pretória, África do Sul.
A primeira dificuldade surgiu logo à partida. Butler estava convencido de que o filme não funcionaria sem a presença de Arnold Schwarzenegger, mas este, após ter ganho o título de Mr. Olympia cinco anos consecutivos, decidira desistir das competições. Foi preciso convencê-lo a tentar mais um ano. Ultrapassado esse obstáculo, o herói precisava de um oponente, alguém que fizesse de vilão. Para encontrá-lo, recorreu-se a Joe Weider, co-fundador da Federação Internacional de Culturismo, criador dos títulos Mr. Universo (amadores) e Mr. Olympia (profissionais), editor de inúmeras publicações dedicadas ao físico e ainda implementador de equipamento para ginásios e de suplementos nutritivos. Weider já estava farto do rosto de Schwarzenegger nas suas capas e tinha alguém em vista para substituí-lo: Lou Ferrigno, um nova-iorquino de Brooklyn, bi-campeão do Mr. Universo.

Devido à vulnerabilidade de Ferrigno, Schwarzenegger teve de assumir o papel de debulhadora, esmagando tudo no seu caminho. Não só seria o herói, como também o vilão. Enquanto que os outros participantes falam em dar o seu melhor, o discurso de Arnold é sobre tenacidade e hegemonia. Arrogante e presunçoso, evidencia um controlo e concentração ímpares, com uma personalidade motivada para o sucesso a todo o custo. Em Raw Iron, admite pela primeira vez que algumas das suas afirmações foram desproporcionadas ou invenção pura e simples, mas algumas ressoariam na memória dos fãs durante décadas. Por exemplo, sobre não ter comparecido ao funeral do pai por estar numa fase crítica dos treinos, ou afirmar com uma naturalidade impressionante ser capaz de desmotivar os rivais mais perigosos e fazê-los perder, quando o abordavam a pedir conselhos. Em Raw Iron, acrescenta ter tomado esteróides anabolizantes, mas que os mesmos se encontravam em fase experimental, à época, e não eram ilegais.
O filme conseguiu uma grande carga de realismo porque os culturistas confiavam plenamente no realizador, com quem há muito já privavam. Apesar do filme colocar os seus astros em diversas situações sociais provocadas, a maior parte destas cenas ficou na sala de montagem porque, ao fim de 100 horas de gravações, a pressão era tão grande para que o projecto fosse rentável que o realizador se concentrou numa óptica da luta de egos. Cortou cenas que evidenciavam fraternidade entre os diversos praticantes e criou tensão onde esta não havia, recorrendo inclusivamente à gravação de novas cenas para enfatizar situações já filmadas (o pormenor da t-shirt de Mike Katz roubada por Ken Waller).

Filmado e montado Pumping Iron, surgiu um novo problema: George Butler estava falido, tendo esgotado os cartões de crédito. Numa desesperada medida de marketing, para atrair investidores e inferir do interesse público, promoveu uma exibição no Whitney Museum of American Art, em NYC, com críticos de arte presentes para avaliarem o corpo dos actores do filme em poses artísticas, em cima de plataformas circulares. Inesperadamente, antes da abertura das portas já se acotovelavam nas bilheteiras mais de 5000 pessoas. Pumping Iron estrearia no ano seguinte.
George Butler realizou em 1982 uma sequela, intitulado Pumping Iron 2: The women. Raw Iron foi construído para acompanhar a edição do DVD comemorativo do 25º aniversário de Pumping Iron, em 2002. É narrado pelo actor Liev Schrieber. Nele, podem ver-se pela primeira vez inúmeros outtakes do original, desde treinos inéditos a momentos de convívio entre aqueles que seriam caracterizados como inimigos, que as cenas em que Arnold Schwarzenegger treinava com Ed Corney foram eliminadas por este ficar em 2º lugar na categoria abaixo dos 91 kg e uma entrevista a Reg Park, mentor de Schwarzenegger
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